Quando a editora em que eu trabalhava resolveu lançar a revista Batera na segunda metade dos anos 90, sugeri que a capa da primeira edição trouxesse três bateristas nacionais famosos e que tivessem estilos e abordagens totalmente diferentes entre si. A direção aceitou a proposta e lá fui eu atrás de três grandes nomes. Depois de alguns telefonemas, reuni Paulo Zinner (Golpe de Estado, Rita Lee), Lazão (Cidade Negra) e Rubinho Barsotti (Zimbo Trio). A matéria ficou sensacional, a capa idem. Fiquei envaidecido pelos elogios que recebi, mas fiquei ainda mais impressionado com a figura e a postura de Rubinho…
É claro que eu conhecia e admirava o seu trabalho com o Zimbo Trio, ao lado de outros dois músicos extraordinários – o pianista Amilton Godoy e o baixista Luís Chaves – e sabia que estava diante de um músico de altíssimo quilate. Só não tinha reparado até então o quanto Rubinho levava o seu ofício com uma seriedade rara até mesmo para os dias atuais.
No papo que tivemos para aquela matéria, tive a certeza que estava diante de uma personalidade fortíssima, daquelas que não levava desaforo para casa, mas que sabia bem quando soltar uma frase carinhosa e espirituosa para um entrevistador/baterista como eu e para a equipe de fotografia e iluminação. Foi a partir daquela tarde agradável, recheada de gargalhadas e frases profundas em relação ao seu amor pela bateria e todos os ritmos que senti que precisava reouvir os quatro discos que eu tinha do Zimbo Trio: Opus Pop (1972), Zimbo (1976), Zimbo Convida (1982) e Zimbo Interpreta Milton Nascimento (1986). Na semana seguinte, depois da audição, saí atrás de todos os outros da discografia da banda como um desesperado. Demorei anos para completar a coleção…
Ele construiu com seus parceiros de trio uma carreira de tamanha dignidade e competência que pouca gente vai conseguir chegar perto do que fizeram. Só a presença do trio em todas as apresentações do programa O Fino da Bossa, comandado por Elis Regina e Jair Rodrigues na TV Record nos anos 60, já faz parte da mitologia da Música Brasileira em todos os tempos. Isso sem contar a inacreditável iniciativa de fundar com os demais integrantes do Zimbo Trio a escola de música CLAM (Centro Livre de Aprendizagem Musical) em 1973, onde desenvolveu um importantíssimo trabalho na formação de novos músicos e, tempos depois, vieram a estabelecer suas próprias carreiras a partir do imenso aprendizado que tiveram lá.
Rubinho tocou também com tanta gente famosa – César Camargo Mariano, Walter Wanderley, Pedrinho Mattar, Dick Farney, Agostinho dos Santos, o guitarrista Joe Pass, os pianistas Oscar Peterson e Tommy Flanangan, o trompetista Kenny Dorhan, os saxofonistas Stan Getz, Gato Barbieri e Zoot Sins, entre dezenas de outros – que havia uma aura de mitologia toda vez que o víamos sentar na bateria. Era como presenciar uma divindade rítmica em ação!
Conto isso porque hoje fiquei sabendo por intermédio do amigo e outro lendário baterista, Duda Neves, que Rubinho morreu. Até o momento em que escrevo estas mal traçadas linhas, ninguém na imprensa noticiou. Espero que tal silêncio jornalístico seja apenas momentâneo e que ele receba todas as devidas homenagens.
Não conhecia este grande músico, obrigado por corrigir isto, Régis.
Que descanse em paz.
Estudei piano no CLAM, anos 80. Eu tinha uns 10 anos. Puta escola! Cara, tive a sorte de “tocar” com ele numa aula de prática de conjunto – ele estava terminando o ensaio e o baterista que ia me ajudar tinha faltado. Aí, só pra eu não perder a viagem, ele quebrou o galho. Lembro até hoje: do meu cagaço (felizmente deu tudo certo) e do sorriso dele no final, dizendo “valeu garoto”! Dia pra ficar eternamente na minha memória. Obrigado, Regis, por falar dele e do Zimbo, essa instituição nacional!